domingo, 22 de abril de 2018

Índios recebem dinheiro do governo para protestar contra o governo

https://www.oantagonista.com/brasil/indios-recebem-dinheiro-do-governo-para-protestar-contra-o-governo/ 20/04/2018

O Ministério da Saúde, por meio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), resolveu bancar a viagem dos índios que, na próxima semana, estarão em Brasília para o Acampamento Terra Livre.


O tal acampamento é organizado por grupos de esquerda, ONGs internacionais e tem também a participação de partidos como o PSOL. O protesto, claro, será contra o governo federal. Michel Temer decidiu demitir nesta semana o presidente da Funai, Franklimberg Ribeiro de Freitas.


Em um áudio obtido pelo site, uma liderança indígena diz que “vamos ocupar palácio, protestar contra ruralista e contra mudança na Funai”.


“A Sesai vai ajudar. Vai mandar passagem e diária”, acrescenta o índio.


A Sesai é responsável por coordenar e executar a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígena. O atual secretário, Marco Antônio Toccolini, disparou um convite (veja abaixo) convocando para o ato em Brasília.


Apuramos que os gastos com essas viagens podem chegar a meio milhão de reais (veja uma solicitação abaixo).

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ATUALIZAÇÃO: O Ministério da Saúde enviou a O Antagonista a seguinte nota de esclarecimento:


1- A presença de presidentes dos 34 Conselhos Distritais de Saúde Indígena (Condisi) e representantes de algumas associações indígenas em Brasília, entre os dias 18 e 27, diz respeito à convocação extraordinária do Fórum de Presidentes de Condisi (FPCondisi). Com a finalidade de otimizar recursos, foram acrescidos à reunião extraordinária: a participação dos presidentes no processo de Chamamento Público das conveniadas; as reuniões dos Grupos de Trabalho da revisão da Política Nacional de Atenção aos Povos Indígenas e do Modelo de Contratação na Saúde Indígena, além da reunião com a Comissão Intersetorial de saúde Indígena do Conselho Nacional de Saúde para tratar da 6º Conferência Nacional de Saúde Indígena;


2- De acordo com o Regimento Interno do FPCondisi, são realizadas quatro reuniões anuais, além das extraordinárias; a convocação extraordinária na semana de realização do Acampamento Terra Livre é uma demanda do Fórum, por entenderem se tratar de um espaço legítimo, de participação democrática e construtiva do Movimento Indígena Brasileiro. Assim, são discutidas pautas específicas da saúde dos povos indígenas durante toda a programação do evento, não sendo possível excluir a instância máxima do controle social da pauta; o Ministério da Saúde apoia a participação de representantes indígenas nessas esferas de discussão por acreditar que esta participação reforça os debates em torno da construção de um modelo de assistência cada vez melhor às comunidades tradicionais;


Vale ainda destacar que apoiar, e aqui entende-se também como custear, as ações de controle social na saúde indígena, é uma das missões do Ministério da Saúde, prevista na PNAPSI.

 

domingo, 18 de fevereiro de 2018

AUTODESIGAÇÃO ÉTNICA DOS HABITANTES DOS RIOS CUMINAPANEMA E EREPECURU [1]

  Onésimo Martins de Castro [2]

          A autodesignação étnica dos indígenas que vivem na região dos rios Cuminapanema e Erepecuru no Noroeste do Pará, contatados oficialmente em outubro de 1987, constitui ainda uma nomenclatura em discussão, embora o termo Zo'é [3] esteja sendo usado a longo tempo pela sociedade envolvente para designá-los. Portanto, neste artigo, proponho apresentar a trajetória de discussão a respeito, os fatores linguísticos e antropológicos que fundamentaram a percepção de sua autodesignação, bem como corrigir algumas distorções de interpretação do termo adotado atualmente para designar esse grupo indígena.

          No período que antecederam ao contato definitivo com essa população, os habitantes da região e os viajantes que se aproximavam de seu habitat os designavam apenas como “Arredios do Cuminapanema”. Isto porque eram totalmente desconhecidos até mesmo de outros grupos indígenas habitantes da margem esquerda do rio Amazonas, quando localizados no final da década de 1970 por mineradores que exploravam aquela região e sobrevoaram algumas de suas aldeias. As únicas informações a respeito desses indígenas consistiam de sinais encontrados por coletores de borracha na beira dos igarapés (riachos) e de encontros relâmpagos com caçadores no meio da selva ou na beira do rio que, felizmente, não causaram atritos entre eles e os exploradores da região.

          O encontro mais marcante com os Kirahi, como denominam os não índios, se deu na margem direita de um igarapé denominado por eles de Kiaré, afluente do rio Cuminapanema.  Neste encontro, relatado pelo Toru e outros em 1991, consta que indo pescar nessa região encontraram um grupo de Kirahi viajando de canoa (ihiet). Embora tentassem se aproximar deles, mas não conseguindo se comunicar verbalmente, esses viajantes fugiram, deixando para trás redes de dormir, facões, machados, etc, que eles recolheram, usaram e gostaram tanto que, quando perceberam a presença de missionários em sua região na década de 1980, eles próprios efetivaram o contato com esses Kirahi. Estavam ansiosos por adquirir esses objetos que havia facilitado em muito suas vidas. Felizmente, nesses encontros casuais, não há registro de choque entre indígenas e não indígenas. Somente a malária fora contraída por eles nessa época, cerca de 20 anos antes do contato efetivado com os membros da Missão Novas Tribos do Brasil - MNTB em 1987. Nessa época a população já estava sendo dizimada por essa doença, mas voltou a crescer de 119 pessoas para 136 no período de 04 anos em que a MNTB atuou em parceria com a FUNAI, dando-lhes assistência à saúde dessa população.

           Portanto, a partir de outubro de 1987, sua língua e cultura passaram a serem estudadas e com isso a busca por essa autodesignação efetivada. No entanto, como eles logo adotaram essas pessoas como parte de seu grupo étnico, evitavam chamá-los de Kirahi e, consequentemente, não havia motivos para se auto identificarem como um grupo distinto desses novos amigos que os assistiam. Também a limitação destes quanto ao uso da língua e pelo fato dos indígenas não falarem nada de português, não foi possível perceber o termo adotado por eles durante o primeiro ano de convívio nessa localidade. Porém em meados de 1989, por brincadeira, um adolescente deixou escapar que eles se autodenominavam Do’é, sendo os missionários, os agentes da FUNAI e antropólogos, que nesse ano passaram também a visitar a área e as pessoas que encontraram no passado eram os Kirahi.

          No entanto, os adultos ao serem inquiridos sobre essa terminologia, insistiam em não atribuir aos missionários o termo Kirahi, alegando que estes já eram também Do’é, termo que após análise linguística foi percebido que significa ‘gente de verdade / gente legítima, ou seja, do- prefixo de humano + ’e partícula de legitimidade ou veracidade, ou seja, do- + ’e  igual a  Do’é ‘gente de verdade’. Como por exemplo: e- prefixo possessivo de 1ª pessoa singular  + -po ‘raiz da palavra mão; epo ‘minha mão’ e do- ‘prefixo genérico de humano’ + po; dopo ‘mão de gente’ contrapondo com kwata “macaco aranha’ + -po ‘mão’ kwatapo ‘mão do macaco’. E após maiores estudos, foi possível perceber que essa autodesignação, opõe-se não somente ao grupo denominado como Kirahi, mas também aos outros grupos por eles conhecidos em tempos pretéritos, tais como os Apãm, os Tapu’ãi, os Rusã, etc.

          Embora, no final de 1989 esse entendimento já estivesse consolidado e o assunto apresentado à liderança da MNTB como proposta de encaminhamento à FUNAI para registro, esses líderes sugeriram aguardar um pouco mais até que levantassem mais dados que confirmassem essas conclusões. Mas como parte da equipe da MNTB foi substituída temporariamente durante o ano de 1990, essa pesquisa foi interrompida e a terminologia não foi oficializada a tempo, dando espaço para que outras conclusões precipitadas fossem adotas, causando sérios prejuízos etmológicos que até hoje ainda precisam ser corrigidos, o que se propõe fazer agora com esta publicação.

          Isso porque, com a chegada de servidores da FUNAI, de outros pesquisadores e de equipes de reportagens no contexto tribal no ano de 1989, passaram a induzir certos nomes à essa população que não tinha nada a ver com a terminologia nativa por eles adotada.  Buré, foi atribuído pela imprensa paulista no jornal ESTADO DE SÃO PAULO em 05/05/89, termo que não consta sequer do vocabulário deste povo. Tupi do Cuminapanema, sugerido pela antropóloga belga, Dominique Tilkin Gallois, após ser informada pelos missionários linguistas de que o grupo pertencia à família Tupi-Guaraní . Posteriormente a mesma antropóloga e seu mestrando em antropologia no livro,  “Povos Indígenas no Brasil, 1987-1990, atribuíram-lhes o termo Dade dizendo significar ‘nós’[4]. Entretanto nessa língua, dade significa ‘amanhã / dia seguinte’, bem diferente do termo ore ‘nós exclusivo’ e até mesmo none ‘nós inclusivo’ que também não são usados como autodesignação por esse povo.
Também um dos sertanistas da FUNAI, João Evangelista de Carvalho, desconhecendo ainda a língua falada por esse povo, mas sabendo um pouco de outra língua Tupi-Guarani e aprendendo a palavra poturu, usada para a madeira da qual fazem o adorno labial, atribuiu-lhes o termo poturujara na tentativa de chamá-los de ‘os donos do poturu’, associando este termo  a  jara ‘dono’ em Tupi-Guarani. No entanto, se assim o fosse o termo correto deveria ser então poturujet e não poturujara como sugerido. Porém, como a equipe da MNTB foi substituída temporariamente durante o ano de 1990, os recém-chegados aderiram a essa proposta, passando a chama-los simplesmente de Poturu, termo cujo uso perdurou por algum tempo, mas nunca reconhecido pelos nativos.

         Portanto, com o tempo e o correto entendimento tanto da língua como dos sentimentos histórico-culturais do povo, os membros da MNTB entenderam que, de fato, o termo Do’é é a terminologia adotada por essa etnia para se autodesignarem em oposição a outros grupos humanos. Porém, como em 1991 foram impedidos pela FUNAI de continuarem atuando nessa terra indígena, a antropóloga acima citada assumiu o controle da área e nesse mesmo ano passou a usar essa terminologia grafando a palavra como Zo’é atribuindo-lhe o significado de ‘nós’[5], uma forma gráfica também aceitável, porém com significado totalmente equivocado, como já houvera feito com a palavra dade ‘amanhã’. No entanto, como até o momento ninguém contestou sua interpretação, essa tradução continua sendo usada como se fosse a correta.

          Retomando a terminologia adotada por essa população, percebe-se que o termo Zo’e (Do’e)  ‘gente legítima’, terminologia já cristalizada para identificação deste grupo indígena, coaduna-se perfeitamente com o sentimento de quase todos os grupos étnicos ao redor do mundo que se consideram como personagem principal, tanto no sentido antropológico como linguístico e também territorial. Em outras palavras sua cosmovisão é de centro do mundo, pois não vieram de parte alguma, mas outros é que migraram para terras distantes e nunca mais voltaram.  Esta forma de etnocentrismo nessa auto identificação é coerente com o registro de Antônio Geraldo da Cunha, no “Dicionário histórico das palavras portuguesas de origem Tupi, 1978”, quando aponta que a palavra abaetê "homem verdadeiro" de aba ‘homem’ + etê "verdadeiro / legítimo", bem como nos registros etnográficos de vários grupos indígenas no Brasil em que geralmente se consideram como “o povo” em relação aos demais grupos cujos nomes são diferenciados.

          Até os primeiros anos do contato com a sociedade envolvente, esta autodesignação era conceituada no fato de que só são Zo’é (Do’e) “os que comem macaco, caçam e pescam usando arco e flecha, não usam roupas, mas sim o tebe pot ‘adorno labial’ feito da madeira chamada poturu." Este último elemento é fator principal em que os distingue-os dos demais grupos indígenas, até então por eles conhecidos, tais como os Tapuãy: povo inimigo com quem tiveram amizade no passado, e do qual adquiriram grande parte dos seus elementos de agricultura e de subsistência, como a banana e a mandioca, mas com a diferença de que usavam a borduna como arma de guerra.   Runsã: povo que no passado raptou um homem Zo'é chamado Tamirim;   Apãm: povo canibal que vivia em casas elevadas em região alagada, que no passado remoto matou e comeu um de seus homens chamado Oitxit, mas sendo posteriormente eliminado pelos Kirahi com quem também tiveram contato naquele tempo.[6]
Não obstante a equipe da MNTB ter enviado em 18 de outubro de 1993 uma nota explicativa à FUNAI sobre a adoção dessa terminologia de autodesignação étnica dessa população indígena, não foi dado notoriedade a esses dados, perdurando-se essa tradução equivocada dessa terminologia adotada.  Portanto, espera-se a partir desta publicação a interpretação correta do termo  Zo’é ‘gente legítima / gente de verdade’ seja considerada pelos  que porventura venham ainda a escrever algo sobre essa etnia indígena.

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[1] Adaptação e ampliação de um documento apresentado à FUNAI em 18 de outubro de 1993 pela equipe de campo da Missão Novas Tribos do Brasil – MNTB, Edward Gomes da Luz, Carlos Lacerda de Carvalho e Onésimo Martins de Castro, primeiros pesquisadores da língua e cultura do povo indígena Zo’é entre os anos de 1987-1991.

[2]  Professor colaborador do PARFOR - Plano Nacional de Formação de Professores / UFOPA, graduado e pós-graduado em Letras pela Universidade Federal do Pará – UFPA, pós-graduado em Antropologia Intercultural pelo Centro Universitário de Anápolis – UniEvangélica e em Gestão Escolar pela Universidade Federal do Oeste do Pará - UFOPA;. E-mail: onesimo.mariana@gmail.com.br, Tel. 93 991159804.

[3] http://www.funai.gov.br/index.php/zoe/2025-quem-sao-os-zo-e.

[4] GALLOIS, Dominique tilkin & GRUPIONI, Luiz Donizete. A Redescoberta dos amáveis selvagens. Povos Indígenas no Brasil de - 1987-1990  CEDI.

[5] https://pib.socioambiental.org/pt/povo/zoe/1964

[6] Textos gravados, transcritos e arquivados em pesquisa linguística e antropológica entre os anos de 1987-1991.

Fonte: https://www.recantodasletras.com.br/artigos-de-sociedade/6256022 

                                                           

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Questão Zo’é: a história que não é contada



"Porque nada podemos contra a verdade, senão pela própria verdade” I Cor. 13:8

   
Tenho acompanhado a discussão nos Blogs e Sites da cidade de Santarém e região em torno das reivindicações da população Zo’é, exibida pela TV Atalaia em Oriximiná e postada no Youtube no final do ano passado - http://www.youtube.com/watch?v=fG5l3vrLOMA 

Como amigo desse povo e tendo feito parte da equipe que os salvou da extinção a que estavam fadados pela malária, já existente antes da chegada dos missionários entre eles, decidi me pronunciar a respeito, para mostrar a verdade que, intencionalmente ou por desconhecimento de causa, tem sido ocultada pela maioria dos que escrevem sobre esse tema.

Isso porque não suporto mais ver o povo brasileiro ser induzido a acreditar em mentiras, enquanto a verdade sobre o assunto não é mencionada. Creio que muitos fazem isso, apenas copiando matérias de outros Sites ou porque ouviram somente o lado deturpado da história. Porém, outros o fazem para se promover ou a fim de ocultar alguma ação indevida entre esse povo. 

Não entendo por que, em toda matéria propagando a entrada e permanência de turistas, pesquisadores, equipes de TV ou praticantes de alguma ação social nessa terra indígena, insinuações maldosas tenham que ser proferidas contra missionários! Isso só revela que há um forte preconceito contra a população evangélica que esses obreiros representam. Segue os fatos, documentalmente comprovados, como realmente o são.

Tudo começou em 1980, quando uma equipe missionária da Missão Novas Tribos do Brasil (MNTB), conveniada com a Funai (Fundação Nacional do Índio), localizou-se na cidade de Santarém – PA, para a execução de um projeto de mapeamento das tribos indígenas nessa região. Empreendendo viagens pelo rio Cuminapanema, localizaram uma tribo indígena isolada que vivia ao norte do Estado e, em agosto de 1982, tiveram o primeiro encontro com aqueles índios.

Com a anuência da Funai, construíram uma pista de pouso, a cerca de 40 kms da primeira aldeia e estruturaram uma base, prevendo um novo contato com o grupo, o que de fato aconteceu no final de 1987. A partir de então, desenvolveram um trabalho completo de assistência social com esse grupo que estava sendo dizimado pela malária, antes da chegada dos missionários. Com uma dedicação sem limites, trataram a saúde do povo, dando-lhes esperança na luta contra a malária já existente entre eles. Com isso,  a situação de saúde do grupo foi revertida e a população que já havia entrado num processo de extinção, voltou a crescer de 119 para 136 pessoas em quatro anos. Hoje, segundo o último censo da Funasa (Fundação Nacional de Saúde), são 250 pessoas.
Isso foi confirmado pelo primeiro médico da Funai a visitar os Zo’é (Poturu) em 1989 quando disse:

“No dia 22.02.89, nos deslocamos para Santarém com a finalidade de fazer um levantamento das condições da assistência prestada pela Missão Novas Tribos do Brasil aos índios (…) Examinamos todos os índios que estavam na missão e constatamos que todos estavam em regular estado de saúde; alegres dispostos, brincalhões (…) Achamos que o trabalho que vem sendo realizado pela missão é muito sério e que eles merecem um reconhecimento pelo amor e dedicação que tem para com os índios.” (Relatório do  Dr. Lauro Moreira Faro à Funai, março de 1989) 

Também, segundo o jornalista Francisco José “Na primeira missão da FUNAI os Poturu estavam tão bem de saúde que até realizaram a dança do urubu para saudar os visitantes. (Globo Repórter, maio de 1989)

Sendo o grupo monolíngue, esforçaram-se no aprendizado da língua e já se comunicavam com eles nesse idioma.  A análise gramatical e fonológica estava em andamento, bem como a elaboração de um dicionário bilíngue. Procedia-se também a pesquisa e análise antropológica de sua cultura. Havia um relacionamento promissor entre missionários e indígenas e vários projetos estavam em andamento. E, reconhecendo que um dia, inevitavelmente, esses índios entrariam em contato com a sociedade envolvente, iniciaram, de forma criteriosa, o processo de preparo para essa futura convivência.

Porém, a partir de 1989, começaram-se as incursões de jornalista e pesquisadores, levados pelos sertanistas ligados à Coordenação Geral de Índios Isolados da Funai, os quais começaram a fornecer, precocemente e em massa, certos bens industrializados, que os missionários criteriosamente evitavam introduzir nessa comunidade. Tudo isso para que os indígenas praticassem seus rituais, mesmo fora de época, a fim de serem filmados ou para carregarem suas bagagens nas incursões pela mata. Mas em seu discurso acusavam os missionários de interferirem na cultura indígena!

Embora esses elementos tenham sido sempre bem recebidos e respeitados, inclusive, recebendo também tratamento de saúde por parte dos missionários ali presentes, traiçoeiramente moveram perseguição religiosa contra eles, caluniando e difamando-os através da Mídia. Dois anos depois, um desses sertanistas assumiu a Presidência da Funai e logo em seguida uma antropóloga estrangeira propôs a ele a implementação de projeto naquela terra indígena, com financiamento obtido “junto à instituições internacionais”, com“levantamento cartorial e  requerimentos minerais” e com “monitoramento via satélite”. E, para isso, impondo que “A condição para a implantação do Projeto (era) a exclusão da “competição” com a MNTB nas responsabilidades das intervenções na área de controle do contato e de saúde….” (Carta de Dominique Gallois a Sidney Possueleo em 14/04/1991)

Assim, em outubro de 1991, sem nenhum processo formal, os missionários foram retirados da área, contra a vontade dos índios que apelavam veementemente para que permanecessem, dizendo: “Aqui é nossa terra e agora é também o lugar de vocês e nós estamos dizendo para vocês ficaram! Quando estávamos morrendo de febre, dor de cabeça e na barriga (sintomas da malária), foram vocês que nos deram remédio e saramos …” Um dos sertanistas que liderava a expedição da Funai, questionado sobre a manifestação da vontade indígena, simplesmente respondeu: “isso não nos interessa no momento” (Texto em fita K7, outubro de 1991).
Em 1998,  para impedir que os missionários fossem autorizados a retomar as suas atividades na aldeia, a MNTB e o então presidente da Funai, foram novamente acusados por esses elementos, com calúnias piores do que as anteriores, levando a MNTB a mover ação de Interpelação Judicial contra esses acusadores. Isso levou também o Ministério Público Federal a  impetrar um Mandado de Segurança contra a Presidência da Funai, acusada de não proteger os índios, e a abertura de um Inquérito Policial para investigar as referidas acusações.

Embora, esse Inquérito tenha demorado 06 (seis) longos anos para ser concluído, a verdade veio à tona. A Justiça Federal decidiu arquivar o processo, acatando pedido do Ministério Público Federal em Santarém, porque a Polícia Federal em seu relatório final, datado de 30 de maio de 2003, declarou improcedentes todas as acusações feitas contra a Missão no decorrer de todos esses anos, como segue:

“Os documentos de folhas 802/803 comprovam que o MNTB agia na região com a anuência da Funai desde 1980, inclusive verificando-se no ofício de fl. 802 a comunicação de que a missão havia encontrado na região ao norte do Pará uma tribo “arredia”, posteriormente identificada como ZO’É. (…)
Pelo exposto, esta autoridade não encontrou provas suficientes para que pudesse concluir que a presença da MNTB na região teria ocasionado a morte da população ZO’É, ou seja, não existe comprovação da relação de causalidade entre a ação do MNTB e o resultado morte dos índios ZO’É.”

Infelizmente, mesmo que a Justiça Federal tenha considerado falsas as acusações levantadas pelos sertanistas, por alguns antropólogos irresponsáveis e pela Mídia sensacionalista, insinuações desse tipo continuam sendo publicadas até hoje em Jornais, Blogs, Sites, etc., uma verdadeira afronta à decisão da Justiça Federal.

Portanto, como cidadão brasileiro, conclamo aos leitores que avaliem sem parcialidade essa causa e se posicionem pela verdade e contra as injustiças praticadas contra essas pessoas. Mas o que mais me aflige é que, depois de mais de 20 anos de contato com pessoas do Brasil e do mundo que adentram suas terras, os Zo’é continuam sendo privados de seus direitos constitucionais e mantidos sob um pseudo isolamento para impedi-los de reencontrarem os missionários que os ajudaram num dos momentos mais difíceis de suas vidas.

Finalmente, os próprios indígenas perceberam o que está acontecendo e decidiram se manifestar contra as arbitrariedades praticadas contra eles, desmascarando a ideologia propagada de que estão felizes no estado a que foram submetidos. O que se espera agora é que o Ministério Público, responsável constitucionalmente por defendê-los, julgue imparcialmente essa causa, devolvendo aos indígenas e aos missionários os direitos que foram vilipendiados por todo esse tempo.

Prof. Onésimo Martins de Castro
Licenciado e Pós-Graduado em Letras pela UFPa e Pós-Graduado em Antropologia Intercultural e em Gestão Escolar


Fonte: https://oimpacto.com.br/2011/01/12/questao-zoe-a-historia-que-nao-e-contada/ - 12/01/2011